sábado, 5 de junho de 2010

História do Vw Gol

O projeto BX começou a nascer em maio de 1976. O primeiro protótipo ficou pronto em dezembro do ano seguinte. Seria um carro de dois volumes, com linhas angulosas, traseira inclinada e motor dianteiro. Para o desenho da parte posterior do Gol que os alemães descreviam como “cortada a machado” , porém, a VW não se inspirou nem no Polo nem no Golf: preferiu basear-se no Scirocco, cupê esportivo baseado no Golf, que chegou a ser importado na época para fins de avaliação. Outras diferenças significativas entre o projeto nacional e seus “primos” alemães estavam na mecânica. Em vez da posição transversal de motor e câmbio, a VW do Brasil optou pela consagrada longitudinal. E o que se constituiria em erro, no lugar da refrigeração líquida usada lá fora e também no Passat, foi escolhido para o Gol o motor boxer (cilindros horizontais opostos) arrefecido a ar de 1,3 litro do velho Fusca. A potência líquida passava de 38 para 42 cv por conta da turbina de arrefecimento, que não precisava de tanta vazão, pois o motor recebia ar direto por estar na dianteira.

Em maio de 1980 o Gol chegava ao mercado, nas versões básica e L, produzido na nova fábrica em Taubaté. Seu nome, associado a esportes como outros da VW (Golf, Polo, Derby), lembrava a paixão brasileira pelo futebol. O desenho era atual e agradável, com frente em cunha, boa área envidraçada, faróis e lanternas pequenos e simples, pára-choques metálicos cromados. O interior combinava elementos do Passat a instrumentos retangulares em uma faixa horizontal, como na Variant II. O espaço no banco traseiro era um tanto escasso, mas o porta-malas oferecia boa capacidade, 380 litros, pois o estepe ficava junto ao motor além de poder ser ampliado para 1.200 litros com o rebatimento do banco. Cintos de segurança dianteiros retráteis de três pontos e um rádio AM mono eram oferecidos. A transmissão, de quatro marchas (a mesma do Fusca e Kombi), dispensava a substituição de seu óleo por toda a vida do carro e o consumo atingia 15,8 km/l a 80 km/h constantes, segundo a VW. No entanto, apesar dessas qualidades, o carro não correspondeu às expectativas.

O motor refrigerado a ar, além de destoar da concepção moderna do Gol, tinha potência insuficiente para suas pretensões. A VW deve ter acreditado que o carro só poderia vingar, especialmente no interior do País, com o consagrado coração do Fusca. Por outro erro de avaliação, a marca priorizou a economia de combustível e optou pela versão de 1.285 cm3 com um só carburador, quando o próprio Brasília vinha com 1.584 cm3 e, desde 1976, dupla carburação. Os 42 cv do Gol “o carro que une razão e emoção”, segundo sua publicidade limitavam bastante seu desempenho em relação aos relativamente ágeis Chevette 1,6 e Fiat 147 de 1,05 e 1,3 litro: acelerava de 0 a 100 km/h em cerca de 22 s e atingia perto de 130 km/h. Só não era pior porque o torque se manifestava logo em baixas rotações e o carro pesava pouco, apenas 750 kg. A posterior versão a álcool, com dois carburadores, não mudaria esse quadro.

A decepção só não era maior porque o chassi permitia tomar as curvas com notável agilidade e segurança para a época. A suspensão dianteira McPherson, com subchassi, a geometria de direção com raio negativo de rolagem e a traseira com eixo de torção de novo conceito seguiam os princípios básicos do Passat; os pneus eram radiais, 155/80 R 13; e os freios utilizam duplo circuito em diagonal, com discos na dianteira.
As vendas logo apontaram a falha e os engenheiros da Volkswagen tiveram de agir rápido. Em fevereiro de 1981 chegava ao mercado o Gol S e LS de 1,6 litro, ainda refrigerado a ar, mas com dupla carburação, potência líquida de 56 cv e torque máximo de 11,3 m.kgf. Se o nível de ruído ainda era elevado, as respostas melhoravam muito e a velocidade máxima passava a 143 km/h, com aceleração de 0 a 100 km/h em 15,4 s. Como os dois carburadores ocupavam mais espaço, o estepe teve de ir para o porta-malas, reduzindo-o em boa parte. Mário Ferreira, dono da concessionária Condor, na capital paulista, percebeu então que bastava montar o pneu com a face externa para cima para que ele se encaixasse sobre o carburador direito. A idéia, simples mas genial, foi logo adotada pela VW.

A não ser por algumas adaptações no mercado paralelo, o Gol continuava carente do motor refrigerado a água. Mas a Volkswagen preferiu guardá-lo para a novidade com que responderia ao Escort XR3: o esportivo Gol GT, lançado em março de 1984. Com o motor de 1,8 litro a álcool que sairia no mês seguinte no Santana, mas “envenenado” com o comando de válvulas mais bravo do Golf GTI alemão, desenvolvia 99 cv de potência, acelerava de 0 a 100 km/h em 9,7 s e alcançava 180 km/h.

A caracterização esportiva estava por toda parte: grade na cor da carroceria, faróis de longo alcance, spoiler sob o pára-choque, rodas de alumínio de 14 polegadas, pneus 185/60, saída dupla do ruidoso escapamento. Por dentro havia bancos Recaro com apoios laterais envolventes, console com relógio digital, instrumentos de grafia vermelha incluindo um reduzido conta-giros, de difícil leitura, e um incoerente vacuômetro e volante de quatro raios, o mesmo do Passat TS. A suspensão mais rígida e os largos pneus davam-lhe ótima estabilidade, mas o câmbio de quatro marchas era inadequado a um motor tão esportivo, em que o torque máximo aparecia em regime elevado. O de cinco marchas veio logo depois. Se o esportivo respondia pela imagem de prestígio da linha Gol, o passo mais importante rumo a seu sucesso foi o motor 1,6 arrefecido a água aplicado às versões S, LS e Saveiro LS para 1985. Desempenho, consumo, nível de ruído, tudo progredia de forma substancial nesse verdadeiro gol. A frente era unificada com o Voyage mas nada é perfeito e o estepe teve de voltar ao porta-malas.

Começaram então as comparações dos diferentes motores. Era patente que o 1,6 “a água” era superior, mas havia quem apreciasse o “a ar”, inclusive elogiando sua aceleração tudo não passava de sensação, como o cronômetro podia comprovar. Mas em agilidade e estabilidade a versão de motor boxer era nitidamente superior, dada a distribuição de peso entre os eixos mais favorável, pelo motor mais leve (98 kg contra 124,5 kg) e centro de gravidade mais baixo.

A autonomia da VW brasileira havia chegado ao motor 1,8, produzido aqui fora das especificações alemãs: as bielas eram curtas, as mesmas do 1,6, o que trazia uma relação r/l desfavorável e causava vibrações e aspereza. Em agosto de 1985, porém, tanto o 1,6 quanto o 1,8 eram padronizados aos alemães, surgindo a família AP, com o mesmo bloco e cabeçote para ambos. O 1,6 tinha curso dos pistões bem menor que o diâmetro (81 x 77,4 mm, contra 78,5 x 80 mm de antes) e também ganhava bielas mais longas, que lhe renderam o apelido de “bielão” e um comportamento muito suave é ainda hoje apreciado por preparadores pelo ótimo potencial de rendimento e durabilidade, chegando a 7.000 rpm sem esforço aparente. A potência chegava a 90 cv, a álcool, e a 80 cv a gasolina. O 1,8 “manso” passava a 96 cv (a álcool) mas o “bravo”, do GT, permanecia em 99 cv provavelmente só no papel, para manter-se em faixa de menor incidência de imposto.

Para 1987 era efetuada sua primeira reestilização: frente mais baixa, pára-choques plásticos envolventes, amplas lanternas traseiras. As versões eram agora C (opção despojada que nunca existiu, servindo apenas para burlar o congelamento de preços do Plano Cruzado), CL, GL, GLS (Voyage apenas) e GTS (só no Gol), desaparecendo o BX. Nesse ano o Gol assumia a liderança do mercado, nunca mais perdida. O esportivo trazia faróis de neblina integrados ao pára-choque, faróis principais maiores como os do Voyage, largas molduras laterais, novas rodas, aerofólio traseiro e o famoso volante “quatro bolas” (botões de acionamento da buzina).

A reformulação do painel, porém, ficou para a linha 1988: foram adotados dois modelos, o mais refinado (para Voyage GL/GLS, Gol GTS e Parati GL) com teclas junto ao volante e instrumentos iguais ao do Santana. Havia enfim um amplo conta-giros e mudavam os retrovisores.

No Salão do Automóvel 1988 a VW apresentava uma versão do Gol que faria história: o GTi, primeiro carro nacional com injeção eletrônica. Instalada no motor 2,0 que o Santana havia recebido em maio, a injeção Bosch LE-Jetronic com ignição mapeada EZ-K permitia respostas suaves, eliminava o afogador e resultava em generosos 112 cv, com torque máximo de 17,5 m.kgf isso utilizando gasolina, pois seria demorado desenvolver uma injeção para funcionar com álcool e havia obviamente uma corrida contra o tempo pela primazia em utilizar o sistema.
O GTi, caracterizado pela cor azul Mônaco e os pára-choques e molduras laterais em prata, lanternas traseiras fumê e novo aerofólio, esbanjava desempenho: máxima de 185 km/h e 0 a 100 em 8,8 s. Dirigi-lo era uma sensação inteiramente nova, com uma resposta ao acelerador que impressionava a todos. Trazia ainda freios dianteiros a disco ventilado. Mas não foi um caminho fácil: durante algum tempo a marca enfrentou problemas eletrônicos que geravam falhas típicas de um carburador sujo num carro sem carburador. Um ano depois, em outro Salão do Automóvel, saía a linha 1991 do Gol com nova reestilização frontal.

Em março daquele ano surgia a primeira resposta ao Fiat Uno Mille: o Gol 1000, com acabamento simplificado e motor AE de 50 cv, que surpreendia pelo funcionamento suave. Em 1993 voltava a oferta do AP 1,6, que antes vinha com Renault/Ford CHT rebatizado de AE 1600, e os pára-choques passavam a vir em cinza.
Quatorze anos depois do lançamento do primeiro Gol, o cenário era outro: havia o Uno Mille, o Escort Hobby 1000 e a sensação de 1994, o Corsa. A Volkswagen tinha de responder com um novo carro pequeno e, mais uma vez, insistiu em projetá-lo no Brasil: o projeto AB9 resultou em setembro de 1994 no Gol de segunda geração. Do antigo modelo restavam apenas a plataforma básica, ampliada em 11 cm na distância entre eixos, e o conjunto mecânico. As linhas, arredondadas e agradáveis, revelavam bom projeto no perfil do capô, que escondia a posição longitudinal do motor. O coeficiente aerodinâmico deficiente do anterior (cerca de 0,45) caía para 0,34, o vão de acesso ao porta-malas era maior e o estepe vinha na horizontal, liberando espaço mas permanecia o estranho roteiro do escapamento, por baixo do eixo traseiro.

Embora todo novo por dentro e mais espaçoso no banco traseiro, ainda faltava a opção de cinco portas. Os motores AE 1,0 (50 cv), AP 1,6 (75 cv) e 1,8 (90 cv, todos a gasolina) utilizavam injeção monoponto digital e sonda lambda. E não havia mais o GTS: apenas o GTI, com belos faróis de duplo refletor e muitos elementos na cor da carroceria.

A linha 1996 marcava ainda a chegada do primeiro VW brasileiro de 16 válvulas, o Gol GTI 16V. O motor 2,0 de 145 cv, importado da Alemanha, trazia bielas mais longas que no 2,0 nacional, para maior suavidade, e permitia acelerar de 0 a 100 km/h em 8,7 s. Para alojar o motor mais alto o capô possuía uma “bolha”. As rodas de 15 polegadas recebiam pneus 195/50, primazia no Brasil, e o interior podia vir revestido em couro preto ou na chamativa combinação de preto e vermelho, incluindo bancos e volante. Na tampa do porta-malas podia ser montado um subwoofer para reforçar os sons graves.

Meses depois surgia o Gol TSi, de apelo esportivo e motor 1,8, passando ao 2,0 no ano seguinte. O modelo “quadrado” chegou a ter injeção na versão 1000i, mas logo desapareceu. Com o encerramento da Autolatina, era preciso substituir o motor Ford e a solução foi desenvolver o AT-1000, de concepção moderna, que chegou no modelo 1997 com oito válvulas e 54,4 cv. A VW de início divulgou 62 cv, sua potência bruta, a fim de parecer superior aos 61 cv líquidos do Palio…

As novas normas de emissões levavam à adoção de injeção multiponto (Mi) Magnetti Marelli nos motores 1,6 e 1,8, que passavam a 89 e 98 cv, na ordem. Na mesma época o motor 1,0 passava a ser oferecido com 16 válvulas e 69,7 cv, passo importante na corrida pelo 1.000 mais potente do mercado. Gol e Parati ganhavam também as opções de bolsas infláveis e de cinco portas há tempos reivindicada, mas que demorou, ao que se conta, pela correção de problemas estruturais da carroceria.
Mas Gol e Parati não demorariam a ser reestilizados, em abril seguinte, no que a VW chamou de Geração III (na verdade não era uma nova geração). Frente, traseira e painel modificados e novos conjuntos de opcionais traziam nova força aos modelos.

Desde então, o Gol recebeu dois novos motores: o pioneiro 1,0 16V Turbo, capaz de 112 cv e um verdadeiro ovo de Colombo, por aproveitar o benefício fiscal aos motores até 1.000 cm3; e um novo 1,0 16V de 76 cv na linha 2002. O GTI foi descontinuado mas o Gol permanece firme como o mais vendido há 16 anos.


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